quinta-feira, 25 de março de 2010

Na verdade ela nunca havia se sentido tão bonita e admirável como naquele dia. Os seus cabelos compridos que sempre estiveram soltos e como ela mesma tinha percebido: definitivamente sem graças, estavam presos agora, em um rabo de cavalo desengonçado, que a deixou com uma aparência séria, ainda mais bonita.
Encostou novamente a cabeça no banco e fechou os olhos, ouvindo a música baixa e lenta que saia dos teus fones de ouvido. Sentindo o vento que vinha do lado de fora do trem, suspirou bem fundo e pensou nele, no rapaz do suéter.
Quando chegou em casa jogou o casaco sobre o sofá. Tirou os sapatos, colocou as pantufas nos pés. Foi até a cozinha e pegou uma garrafa barata de vinho tinto na geladeira. Ela chorou muito naquela noite. Na verdade estava sentindo medo de cair no abismo de outros olhos, medo de saber que mesmo que amasse alguém, ninguém poderia devolver todo esse amor pra ela, ninguém amaria alguém tão fraco e tão pequeno. Mas quando mencionava essa palavra, seu corpo estremecia.
Olhou no espelho e no reflexo viu seus olhos inchados, vermelhos, assim como ontem, anteontem... Cambaleando foi até a sala e pegou o telefone, o olhou por alguns minutos depois finalmente discou, o levou até a orelha e esperou. Logo atenderam e uma voz rouca chegou até seus ouvidos. A voz sem obter resposta, desligou.
Ela fechou os olhos, e mais uma vez sangrou, chorou feito uma criança.
Os seus olhos se fecharam lentamente e o seu corpo de tão exausto caiu no chão.
Por um momento sua mente saiu da realidade e entrou no mundo dos sonhos, de vez tão menos doloroso. O que lhe surgiu na mente foi um beijo. Tão verdadeiro que na sua boca sentiu o gosto daqueles lábios. Sentiu as mãos macias e molhadas entre os seus cabelos e isso fez com que lhe surgisse certo arrepio. Era noite, quente, tão quente que lhe fazia sentir calor do seu corpo sobre o chão frio. Os braços que não soltavam sua cintura cada vez mais puxavam aquele corpo diante do seu. Forte como se quisesse atravessá-lo, quente feito um abrigo.
Ela acordou assustada, tão confusa e fraca que não conseguiu levantar do chão. Sua cabeça girava, e ficava difícil enxergar alguma coisa com os olhos tão embaçados. Se jogou novamente no chão, fechou seus olhos e sentiu sua sala rodar. Lembrou do sonho. E os ventos que surgiram na sua barriga fizeram com seu coração disparasse.
Do lado de fora chovia forte como se nunca mais fosse parar. Ela acordou e se deu conta que estava sozinha novamente. Tão sozinha quanto na noite passada. Tão sozinha que o silêncio não era mais assustador pra ela. Ficar ali contando a si mesma seus próprios medos se tornou uma saída, ninguém poderia ser tão confiável quanto ela mesma. Ou não, não tinha certeza disso agora, pois já havia traído a si mesma tantas incontáveis vezes.
Hoje seus olhos ardiam por não ter mais forças pra chorar, e quando não conseguia evitar, chorava até que os sentisse queimar. Era inevitável não sentir falta daqueles olhos castanhos. Algumas vezes ela chegara a ouvir as canções sussurradas próximo ao seu ouvido quando fechava os olhos, a mesma voz que a acalmara muitas vezes.
Era doloroso sentir saudades, mas não podia impedir que o buraco do seu peito se abrisse cada vez mais. Não agora. Não encontrava forças pra isso.